terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

A morte e a morte de Quincas Berro D`água


Por Eduardo Alves dos Santos (Letras Português e Espanhol/ UFFS)


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Escrito por Jorge Amado (10/08/1912-06/08/2001), membro da academia brasileira de letras, autor de muitas obras de grande sucesso, como “Gabriela Cravo e Canela” e “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, o romance “A Morte e a Morte de Quincas Berro D`água ” é uma história muito engraçada, que foi inicialmente publicada em maio de 1959 pela revista carioca “Senhor”. Com ilustrações de Glauco Rodrigues, a novela teve sua primeira edição, pela Livraria Martins Editora, São Paulo, em 1961. Esta obra apresenta linguagem de “fácil compreensão”, um enredo muito interessante e também engraçado.

O romance conta a história de Joaquim Soares da Cunha, respeitado pai e marido, residente de Itapegipe, área nobre de Salvador, Bahia, que um dia ao se dar conta de que está ficando velho abandona sua família para se entregar aos vícios, principalmente á bebida/ esta seria sua “primeira morte”, a moral. Quando Joaquim abandona sua família, que segundo ele não o amavam, ele se muda para Tabuão, área pobre, mas também de Salvador, onde conhece sua “segunda família”, a da rua, seus companheiros de noite e bebedeira. Entre tantas pessoas que ele apegou amizade, os mais próximos eram Negro Pastinha, Mestre Manuel, Curió, Cabo Martins, Pé-de-Vento e seu amor das ruas Quitéria do olho arregalado. Nas ruas é também onde Joaquim recebe seu apelido de Quincas Berro D`agua, por causa de terem oferecido água como se fosse cachaça para ele, e o mesmo ter dado um grito ensurdecedor de “água”.

 
Após Quincas sofrer sua “segunda morte”, comprovada por um médico, sua família decide esquecer de seu abandono, lembrar de todos os anos que ele fora uma pessoa responsável e dar-lhe um funeral considerado mais digno (Católico). Mas no decorrer da cerimônia fúnebre, os amigos de Quincas, de Tabuão, chegam para presenciar a despedida , mas ao encontrarem Quincas com um sorriso aberto no rosto o dão por vivo, daí então começa uma caminhada literalmente para sua “terceira morte”.
 
Pode-se também constatar nesta magnífica obra que mesmo o autor tendo se expressado de forma hilariante, e muito bem por sinal, ele transmite uma notável disparidade entre os “dois mundos” apresentados na história, Itapegipe e Tabuão, uma forte disputa entre classes e culturas, a dos ricos e católicos “contra” a dos pobres e com suas mistura de crenças.
 
Em suma, é um texto prazeroso de se ler, com vocabulário diversificado, mas sem ser extravagante, um ótimo desenvolvimento da trama e um impactante e dramático fim, o que  certamente justifica a fama deste grande autor.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Vidas Secas – Um filme feito com recursos simples, porém de forma espetacular



Por Eduardo Alves dos Santos (Letras Português e Espanhol)


  O filme Vidas Secas trata-se de uma releitura cinematográfica do livro Vidas Secas, escrito pelo, entre outras coisas, romancista realista brasileiro Graciliano Ramos. Graciliano nasceu no município de Quebrangulo no Alagoas, em 27 de outubro de 1892 e veio a falecer 61 anos depois na cidade do Rio de Janeiro. Era um escritor que se preocupava com a realidade existente no sertão brasileiro, em explicitar o como era a vida do cidadão nordestino. Além da obra Vidas Secas, Graciliano Ramos é autor de algumas obras muito importantes em âmbito nacional, como a obra Caetés, ganhadora do premio Brasil de Literatura no ano de 1933. O autor também possui uma grande quantidade de obras póstumas, como Memórias do Cárcere publicada no mesmo ano de seu falecimento e Cartas à Heloisa, esta já no ano de 1992.

Voltando ao filme, Vidas Secas data do ano de 1963, exatamente 10 anos após a morte de Graciliano. Foi dirigido pelo cineasta Nelson Pereira dos Santos, considerado um dos mais importantes cineastas brasileiros, principalmente por causa deste trabalho. Para se ter a noção da importância deste filme, segundo o site Wikipédia, “foi o único filme brasileiro a ser indicado pelo British Film Institute como uma das 360 obras fundamentais em uma cinemateca.” (Wikipédia). Além disso, o filme foi indicado à “Palma de Ouro”, premio com o maior prestigio dentro do “Festival de Cinema de Cannes”, que acontece todo ano na cidade de Cannes, Riviera Francesa. Para finalizar com chave de ouro suas importantes premiações, recebeu o prêmio do OCIC e o prêmio dos cinemas de arte.

A trama se passa em meio ao semiárido nordestino. Neste contesto de exclusão socioeconômica se apresenta um modelo de família nordestina da década de 50, formada por Fernando – o pai, Sinhá Vitória – a mãe, o filho maior e o filho menor. Não podemos esquecer-nos do cachorro Baleia que também pode ser considerado um dos personagens centrais da trama. Além destes, apresentam-se o fazendeiro que se torna patrão de Fernando e o soldado amarelo.

Em relação á história em si, trata-se de um filme que faz você se colocar na situação de miséria e sofrimento passada pela família de Fernando. Nós que moramos na região sul do Brasil, não temos a noção de como seria ficar sem um item tão básico para a sobrevivência, como é a água. Más este crédito de passar a realidade como ela verdadeiramente é, não deve ser dado ao filme, más ao saudosíssimo escritor José de Alencar. O filme por seu lado conseguiu, em minha leitura, transmitir de maneira muito realista o que o autor José de Alencar queria explicitar. Um destes pontos que o filme transmite muito bem, é o que chamamos de zoomorfização. Este termo é utilizado para explicar uma transformação do ser homem racional para um animal. No filme isso pode ser visto em situações onde os personagens disputavam comida com o cachorro baleia, colocando-se em um “mesmo nível” do animal.

Dou atenção à forma com que este filme foi feito. O senário, os sons de fundo, a forma de filmagem, entre outros aspectos, são todos realizados de forma muito simples, se compararmos com as superproduções norte-americanas que são consideradas um referencial para o cinema mundial nos tempos atuai, porém possui alguns truques que fazem com que seu desenrolar se torne até melhor que os filmes cheios de efeitos produzidos por lá. Um destes pontos que me marcou, foi a sensação da câmera estar dentro dos olhos dos personagens, como se pudéssemos incarnar este personagem, ver e sentir o que existe ao seu redor.

Um ponto interessante é o de que o filme só possui senas gravadas durante o dia. Eu consigo pensar em duas explicações, até meio obvieis, para esta escolha do diretor em filmar somente durante o dia. A primeira seria de cunho meramente cinematográfico ou de efeito visual, assim como queiram. Desta forma, utilizava-se da luz incomparável do sol e evitava-se utilizar uma fonte de luz artificial que não da o mesmo destaque que a luz do dia atribui. Uma segunda forma que pensei, seria a respeito do que se queria passar com o filme ou o que se queria passar do livro para o filme. Explicando desta forma, isso ocorreria para tentar aumentar a sensação de desertificação do semiárido, tentar dar ênfase ao lugar que passa a história, afinal é durante o dia que o calor é infernal e que as pessoas têm de se virar pra sobreviver.

Finalizo explicitando meu contentamento para com relação ao filme. Posso dizer que não esperava nem mais nem menos do que vi. Confirmei com ele que para um filme ser bom e segurar a atenção do espectador não necessita de explosões, senas vulgares ou até mesmo um enredo dinâmico. Com a mesma calma que o cidadão nordestino espera pela chuva, o filme se desenrola, sai do ponto inicial para após algumas reviravoltas voltar ao seu ponto de partida.